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Pacote do Veneno: entenda os impactos do projeto de lei que amplia o uso de agrotóxicos no Brasil

 

Com a aprovação do projeto, o número de químicos liberados no Brasil ultrapassou 2 mil rótulos.

Por: Amábile Galvão,
Elisângela Schmidt,
Gabriel Ramos,
Gabriel Ribeiro,
Luana Abrantes,
Lucas Franco

 

Uma alteração no Projeto de Lei (PL) 6299/2002, apelidada de “Pacote do Veneno” foi aprovada por uma comissão especial em julho de 2018. Com a mudança, o Ministério da Agricultura, que seria o maior interessado na aprovação do projeto, passa a ser o responsável pela regulamentação, classificação e liberação do uso de agrotóxicos. Assim, o assunto deixa de pertencer às pastas de Meio Ambiente e da Saúde. O projeto foi criado por Blairo Maggi, ex-ministro da Agricultura e um dos homens mais ricos do agronegócio brasileiro. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), a alteração na legislação é inconstitucional, ferindo pelo menos seis artigos da Constituição. Para os pesquisadores, produtos químicos com substâncias que provocam alterações hormonais e danos ao sistema reprodutivos teriam sido liberados. Entenda:

 

O que são agrotóxicos?

São recursos utilizados na produção agrícola, auxiliando no controle de doenças e pragas. Promovendo assim, o aumento da produtividade do que é cultivado. Por outro lado, o uso excessivo de agrotóxicos causa desequilíbrio ambiental, trazendo também reflexos para a saúde da população.  De acordo com o último levantamento oficial, o Paraná é o estado brasileiro com maior índice de intoxicação por agrotóxicos mal administrados.

Os produtores

De acordo com Allan Christian de Souza, que é engenheiro agrônomo e agricultor, o uso de agrotóxicos nos cultivos pode trazer problemas para a saúde, mas apenas quando administrados de forma errada. “Não podemos ser hipócritas em dizer que não (sobre trazer riscos para a saúde), porém, só podem trazer problemas quando manipulados, utilizados e descartados de forma incorreta, assim como qualquer medicamento urbano, combustíveis, pilhas e baterias”, esclarece.

Allan também comenta sobre eventuais desvantagens no uso dos químicos. “Existem desvantagens no uso incorreto desses recursos, assim como em qualquer outro. Por este motivo as fiscalizações de agências reguladoras são intensas e severas. Caso sejam utilizados corretamente, as desvantagens acontecem apenas para o agricultor, a pessoa que investe e espera o retorno (…) é o único que segue todas as normas de segurança, utiliza e descarta de maneira correta os produtos e embalagens, tem um custo elevado sobre a produção que nem sempre tem o retorno esperado, sobram os prejuízos”, pontua o agricultor.

Thiago Shaniuk Guse, técnico e graduando em Agronomia, aponta para um dos fatores que leva ao uso desenfreado de agrotóxicos. Para ele, as pragas têm se tornado mais resistentes, forçando os produtores a aumentar a utilização de químicos. “Quanto maior o uso de agrotóxicos, mais será necessária a aplicação. Assim como numa gripe, você pode tomar o remédio e ele resolve o problema na hora, mas o vírus se adapta, é assim com as pragas. Elas estão conseguindo sobreviver mesmo com o uso de alguns agrotóxicos”, disse.

Nilton Alves Rodrigues, de 51 anos, comercializa os produtos cultivados em sua pequena propriedade localizada no San Martin, em Ponta Grossa (PR). Mesmo dando preferência para o cultivo orgânico, Nilton afirma que é impossível produzir verduras 100% livres de químicos. “Utilizo apenas os registrados [para agricultura orgânica]. Existem muitos produtos químicos liberados para a agricultura orgânica. Sem eles, temos muitas perdas na produção. é quase impossível produzir orgânico porque a contaminação está na água, no esterco, e é difícil encontrar um lugar sem contaminação”, conta o produtor.

Feira-13

 

O que dizem os pesquisadores

Gessica da Costa, professora e mestre em biologia evolutiva (com ênfase em microbiologia ambiental), faz um aviso sobre a liberação em massa de agroquímicos. “O Brasil é um dos maiores produtores agrícolas, e também um dos maiores consumidores, não vejo necessidade de mais. Se são proibidos em outros países, tem um motivo. Eles têm um nível de toxicidade, mais de 40% são considerados altamente tóxicos, são perigosos”, alerta.

Gessica ainda menciona possíveis danos para a saúde de aplicadores. Segundo ela, estes produtos trazer riscos, principalmente quando há uma exposição em longo prazo. Vários casos de aplicadores associados ao câncer e coisas assim já foram pesquisados, há artigos falando sobre isso. “Há casos de agrotóxicos de altos níveis de toxicidade associados a problemas de visão, cegueira”, afirma Gessica.

A professora também comenta sobre a degradação ambiental pelo uso de agroquímicos. Isso ocorre, por exemplo, quando o agrotóxico é absorvido pelo solo, podendo entrar em contato com lençóis freáticos. Muitos deles dizimam a microbiota do solo, a qual é responsável pela ciclagem do nitrogênio além de preparar vários nutrientes para a absorção das plantas. A perda da diversidade de micro-organismos quando existe esse contato é muito grande, afirma a cientista.

O pesquisador Ricardo Olchaneski, pós-doutor em microbiologia ambiental salienta a importância para a questão do meio ambiente. “Diversos casos já foram publicados, sobre questões de infertilidade de anfíbios, por exemplo, além de problemas para outras espécies. Questões como essa quebram todo um equilíbrio ambiental, importante para o mantimento da saúde do meio ambiente, que a longo prazo pode afetar também os humanos”, conta o pesquisador. Na opinião de Ricardo, a liberação de agrotóxicos visando maior resistência de culturas não é necessária. “Antes da PL, já possuíamos muitos químicos liberados, é apenas uma questão de pesquisar um que se adeque às necessidades da sua cultura”.

Escute o podcast com Maxilaine Franciele Freitas, aplicadora de agrotóxicos que sofreu com efeitos da exposição.

Escute a entrevista completa da pesquisadora Gessica da Costa.

Veja as imagens de comparação entre verduras orgânicas e as produzidas com uso de agrotóxicos:

 

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