Fonte: Freepik

Cerca de cinco mil crianças e adolescentes estão na espera de uma família

A maioria delas tem mais de quinze anos e encontram-se na região Sudeste do país

Por Milena Batista e Yago Almeida

Conforme o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o número de adoções caiu 46% na pandemia. Em 2019, por exemplo, 3.143 órfãos foram adotados. Porém, em 2021, este número diminuiu para 1.517. Essa baixa ocorreu devido ao fechamento de fóruns, além das visitas de assistentes sociais e das famílias, que não puderam acontecer por conta da pandemia.

Atualmente, segundo o CNJ, pelo menos cinco mil crianças e adolescentes esperam pela adoção. Grande parte das crianças e adolescentes disponíveis à adoção encontra-se na região Sudeste do país. A maioria delas tem mais de quinze anos.

A soma de crianças e adolescentes aguardando pela adoção resulta cerca de cinco mil, segundo o CNJ

O momento da adoção

Para o casal Daniela e Wagner Lopes Pereira foi necessário aguardar por dois anos e quatro meses para o momento da adoção. Ela e seu marido, sempre quiseram se tornar pais. “Depois de algum tempo tentando engravidar, procuramos um médico, já que a gravidez não acontecia. Após diversos exames, constatou-se que não havia nada de errado com nenhum dos dois. Foi então que resolvemos partir para a adoção”.

O casal adotou um garotinho de cinco meses, há nove anos. “No perfil colocamos que poderia ser uma ou duas crianças de até seis anos”. Em relação ao primeiro encontro com o filho, Daniela diz: “Nasci como mãe e meu marido como pai. Foi uma emoção gigantesca, que não cabia no coração”.

Maria Isabel Morasco Nogueira, sempre teve o sonho de ter dois filhos, um biológico e um adotivo. Há seis anos, ela adotou um menino de apenas sete dias, após aguardar na fila da adoção por quatro anos. “Foi muito emocionante, um amor incondicional. Apesar de conhecer ele somente naquele momento, parecia que eu já o conhecia, cada detalhe: olhos, boca, mãozinha, pezinho. Foi maravilhoso”!  Segundo ela, hoje, está completa. “Fiquei emocionada e realizada. Até agora, é uma das palavrinhas que mais amo ouvir: “mamãe””.

Aplicativo A.dot facilita a adoção de crianças e adolescentes

O aplicativo A.dot surgiu com o foco de dar visibilidade aos invisíveis. Completou quatro anos no ar, no dia 25 de maio de 2022, já que foi lançado no dia nacional da adoção. A jornalista Adriana Milczevsky, idealizadora do aplicativo, conta que levaram pelo menos onze meses na produção, no desenvolvimento e no processo criativo do mesmo.

“Quando participei do encontro nacional de grupos de apoio à adoção, em Fortaleza, conheci um juiz que, na época, atuava na primeira Vara da Infância de Cascavel e comentei com ele sobre a minha vontade de gravar vídeos com adolescentes, já que meu foco sempre foi trabalhar a adoção de filhos maiores Eu gostaria que o senhor me autorizasse a entrevistar esses jovens que estão prestes a sair do abrigo”, falou.

A jornalista prossegue relatando como o projeto de desenvolveu: ‘’Como eu trabalhava na RPC, queria fazer uma reportagem com esses jovens, mas ele falou que não poderíamos expor ninguém por uma questão de proteção.”

 Adriana propôs então que se fizessem esses vídeos em um espaço controlado, apenas com quem estivesse no processo de adoção. “A partir disso, foi marcada uma reunião para falar sobre o assunto e assim, surgiu a ideia do aplicativo”.

Adriana é jornalista e mãe por adoção, com o propósito de dar visibilidade às crianças por meio do seu trabalho como jornalista, ela e mais alguns amigos da área trabalharam nessa ferramenta, o A.dot. O Grupo de Apoio à Adoção Consciente, onde Adriana atua como presidente há quase 10 anos, é a organização responsável por sustentar a ideia, “é quem apadrinha o projeto e quem paga os custos do aplicativo, além de fazer o preparo das famílias que adotarão através do judiciário”, diz ela.

O grupo teve como foco as crianças com menos chances de serem adotadas. “Todos que o Cadastro Nacional de Adoção (CNA), dizia que não possuíam nenhum pretendente e foi justamente com eles que fomos trabalhar”.

Em relação ao CNA dizer que essas crianças não tinham mais chance, Adriana comenta que o motivo para essas crianças não serem adotadas é falta de visibilidade que tem, “Elas são números, nomes e idade. Uma coisa é você me perguntar numa sala fechada com uma folha na minha frente se eu quero adotar um adolescente de 17 anos, outra coisa é você mostrar o vídeo, colocar o adolescente na minha frente, eu ouvir a voz dele e olhar nos olhos”. Foi com essa premissa que Adriana conseguiu apoio para o projeto.

Mais de 500 crianças fizeram parte do aplicativo. Tiveram êxito e conseguiram 45 adoções “raras”, as quais o Sistema dizia que eram  impossíveis. “Além de mais de 50 crianças e adolescentes em fase de conhecer a família, no processo de adaptação”, conta a jornalista.

Segundo Adriana, no aplicativo pode qualquer idade, de zero a acima de 18 anos. O Sistema diz, que com 18 anos, o jovem sai da instituição de acolhimento e não pode mais ser adotado. Por outro lado, no aplicativo, se o juiz da comarca disser que aquele que está completando 18 anos pode ficar mais um período conosco, ele fica. “Quem decide quais são as crianças e adolescentes que entram no aplicativo, são exatamente os juízes das comarcas, sendo a maioria adolescentes, grupos de irmão e especiais”, completa.

De acordo com Adriana, é deixado bem claro que a preferência deve ser dos filhos, não dos pais. “Nós estamos ali para encontrar pais adequados para esses filhos que precisam, e não o contrário. Eles entram com perfis muito tradicionais, pretendendo crianças menores de até 10 anos e não aceitam irmãos. Mas, a partir do momento em que entram no aplicativo e conhecem o filho real, muitos mudam de opinião”.

O A.dot está presente em nove estados do Brasil, sendo eles: Acre, Amazonas, Bahia, Minas Gerais, Paraná, Paraíba, Pernambuco, São Paulo e Tocantins. Ele também pode ser usado por pretendentes brasileiros que moram fora do país. Qualquer pessoa habilitada no processo de adoção, inscrita do Sistema Nacional de Adoção pode entrar no aplicativo. “Precisamos de pais preparados, pois os filhos já estão prontos para a adoção”, afirma a idealizadora.

Adriana conta que o número de adoções realizadas pelo aplicativo aumentou durante a pandemia: “Porque diferente de um sistema que não estava preparado para um percurso todo online, nós já nascemos online”. Dessa forma, o número de tribunais de justiça e o número de vídeos foram duplicados. Quando um pretendente tem interesse por algum dos filhos que estão no aplicativo, ele pede a aproximação e este pedido será encaminhado para a comarca de onde o filho está inscrito. Por fim, a equipe técnica dessa comarca entrará em contato com a família, fazendo o mesmo processo que eles fazem na justiça de forma comum. Após a avaliação do perfil, e o chamado para a entrevista, se tudo der certo, a família recebe uma guarda provisória, na sequência a sentença de adoção e, aí sim, a adoção propriamente dita.

O que é necessário para adotar?

Trata-se de um processo gratuito, podendo ser realizado por qualquer pessoa com mais de dezoito anos, sendo casada ou não. Além disso, é preciso haver uma diferença de dezesseis anos entre ela e o adotado.

Com isso, o Poder Judiciário oferece um curso preparatório gratuito, onde são dadas orientações e análises para, dessa forma, definir se a pessoa está apta ou não de adotar uma criança.

É fundamental passar pela avaliação técnica. Onde serão relatadas as expectativas e motivações dos candidatos em relação à adoção, observando a realidade social de cada um e definindo se possuem todas as condições impostas pela lei, para aí sim, adotar. Momento em que a criança ou adolescente, passa a ter todos os direitos de um filho.

Entretanto, a primeira coisa a ser feita é entrar em contato com a Vara da Infância e da Juventude e mostrar certos documentos, que serão analisados pelo Ministério Público. Segue alguns deles: Comprovante de renda e de residência; atestado de sanidade física e mental; certidão de antecedentes criminais; cópias da cédula de identidade e da Inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF); cópias autenticadas da certidão de nascimento/casamento, ou uma declaração relativa ao período de união estável.

Posteriormente, a criança ou o adolescente morará com a família, juntamente do acompanhamento do Poder Judiciário por um prazo de no máximo noventa dias.

Jovens em abrigos que completam dezoito anos

Ao completarem 18 anos, normalmente, os jovens são encaminhados para uma república ou um lar. De acordo com a Agência Senado, a Comissão dos Direitos Humanos (CDH), os órfãos que saem das instituições de acolhimento familiar, quando completam dezoito anos, terão prioridade no acesso aos programas e projetos públicos de financiamento estudantil, além do apoio para obter o primeiro emprego.

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