Silhouettes of Diverse International Students Celebrating Graduation

Por Gabriel Guachineski

            Atualmente o sonho da formação acadêmica está mais acessível, seja pela na oferta de cursos e instituições, seja pelos meios de financiamentos que facilitam a realização de sonhos de muitas pessoas.

            Com dados do Censo da Educação Superior de 2018, havia 2.537 instituições de ensino superior, sendo 81,5% faculdades. A oferta de vagas em cursos de graduação foi de 13,5 milhões sendo 72,9% vagas novas e 26,9% vagas remanescentes. A modalidade a distância colaborou com o aumento de ingressantes na educação superior em 2018, compensando a queda registrada nos cursos presenciais.

            Porém os dados não demonstram as dificuldades e desafios enfrentados pelos estudantes que almejam um diploma e carreira, seja por questão financeira, conciliação do tempo de estudo com trabalho, e preconceitos por cor ou gênero.

            As poucas horas de sono, a alta carga de informações todos os dias e o cansaço físico e mental aumentam as chances de evasão, em algumas regiões não tem estrutura educacional fazendo os estudantes viajarem para outros centros na busca pelo curso desejado. Uma mudança na rotina e distanciamento dos familiares muitas vezes.

            Outra questão ainda mais preocupante e grave é o preconceito, que pode se manifestar de várias maneiras: religiosa, gênero sexual, raça etc. Segundo matéria publicada pelo O Estadão, são discriminadas e maltratadas pessoas negras, homossexuais, nordestinos entre outras. A reportagem observa que muitas pessoas não são capazes de perceber que sua fala ou atitude são resultado de uma construção social preconceituosa e discriminatória.

Uma história

Um grande exemplo de superação e conquistas vem da cidade de São Luiz no Maranhão, estado do nordeste brasileiro. Aldeniza Costa de Jesus, 42 anos, mãe de um casal de filhos, conquistou a tão sonhada formação de Bacharel em Direito. Ainda criança despertou o sonho de ser advogada, porém, a ingenuidade de criança fazia pensar que poderia ter várias profissões divididas em turnos.coleta 2Aldeniza Costa de Jesus

Com o passar do tempo as escolhas foram ficando mais claras, quando ainda pequena desistiu da carreira de modelo enquanto passeava pelo centro de sua cidade natal e avistou um manequim de vitrine careca, história contada até hoje por sua mãe.

Aldeniza já tinha em mente as brincadeiras com diversos papéis e personagens desenhados trajando roupas socias, com pastas nas mãos que dava a impressão de importantes e bem sucedidas, o que fez acreditar e sonhar na carreira. O tempo foi decisivo para descobrir que o estudo poderia lhe tornar o que quisesse, remodelando seu sonho e buscar uma carreira ainda maior.

As dificuldades eram grandes. Na sua época de juventude Aldeniza conta que as barreiras em seu estado vinham desde a desigualdade social, onde pessoas de baixa renda como ela não tinham muitas oportunidades de se aperfeiçoar após a conclusão do ensino médio. Não eram todos que conseguiam sequer um curso de datilografia e na falta de qualificação nem sempre arrumavam emprego. Aos 16 anos Aldeniza passou a trabalhar em casa de família como era comum naquela época para muitos jovens.coleta 1Aldeniza Costa de Jesus

Diante das dificuldades financeiras, o trabalho de empregada doméstica e babá ajudava sua família nas despesas de casa. Filha do meio dentre nove irmãos, após abandono do pai, cada um dos seis irmãos foram criados pelos tios, onde alguns foram maltratados, humilhados e sofreram privações. Alguns tiveram momentos bons, sendo que em determinado período, um de seus tios que era solteiro acolheu a todos, se tornando um anjo enviado por Deus para ajudá-los, após esta fase.

Uma das experiências marcantes na vida de Aldeniza foi a ida ao Rio de Janeiro, onde trabalhou durante dois anos, conciliando longos períodos de trabalho e estudos. Não tinha folga, pois, acompanhava a família na qual trabalhava durante viagens e passeios, tempo de muita dedicação e esforço.

            A primeira da família com formação acadêmica, Aldeniza atualmente tem duas de suas irmãs formadas nos cursos de Pedagogia e Assistente Social. Estudantes de escola pública, recebiam apoio de sua mãe que se esforçava em oferecer o melhor nos estudos de seus filhos, pois, para ela o estudo traria uma vida melhor.

Saindo de casa

Tomada a decisão de deixar sua terra natal em busca de melhores condições financeiras e ajudar sua mãe, Aldeniza viajou para o Rio de Janeiro em 1994, onde trabalhando muito e com todo esforço mandava todo seu salário para sua mãe no Maranhão. Dois meses depois, seu destino foi o Paraná, em busca de um serviço digno e com salário pela qual pudesse ter estabilidade.

            Sua vinda ao Paraná na cidade de Telêmaco Borba lhe trouxe diversos aprendizados, dificuldades e força para correr atrás de seu sonho. Foi balconista de padaria, atendente dos correios, promotora de vendas e chegou até o estágio na área de Direito.

O clima frio se comparado a da região nordeste, os perigos de estar sozinha, costumes e sotaques do Paraná e novas profissões foram aprendizados que Aldeniza superou. Morando no início com sua irmã, e passando a pagar aluguel, passou mais dificuldades com salário que não cobriam todas as despesas, mas com ajuda de amigos superou. De uma em especial, a Dona Maria, Aldeniza tem boas recordações e carinho. Ela diz recordar do cheiro e gosto da comida de sua querida amiga.

Quase desistiu

Foram dois vestibulares pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, nos quais apenas um ela soube o resultado, pois, não havia acesso com facilidade à informação. Depois realizou cursos de informática, inglês básico e secretariado.

Houve momentos em que pensou em desistir, pois, havia pessoas que desacreditaram no potencial de Aldeniza, como numa citação que ela faz de um professor que ao ser perguntado sobre o que ele achava deste sonho de ser advogada, o mesmo disse ser tarde, porque, a concorrência com os jovens seria grande, situação que lhe entristeceu muito.

A questão financeira pesou na decisão de desistir da faculdade, pois arcar com as despesas já não era possível, sem falar na dificuldade de pagar uma pessoa para cuidar de seus filhos pequenos, porém, graças a Deus e todo esforço possível ela seguiu em frente.

Aldeniza conta que em dias de provas escondia seus cadernos na gaveta do balcão, para estudar escondido de seu gerente, entre um atendimento e outro. Ela se desdobrava em ajudar seu filho com tarefas da escola. Passou por um divórcio no seu primeiro ano de faculdade, e sofreu bullying por parte de colegas que formavam grupos para trabalho e a ignoravam. Mas, ela não se abateu e conquistou bons colegas e teve ótimas apresentações e notas em grupo.

Casou-se e com muita fé em Deus se converteu a Cristo em 2000, ano em que nasceu Matheus seu primeiro filho, “seu príncipe”, como se refere. No ano de 2006, veio a filha Maria, sua princesa. Os estudos ainda eram o foco de Aldeniza, que fez o Enem, conquistou bolsa e iniciou o curso de Ciências Contábeis que era sua terceira opção, porém no decorrer do curso conseguiu transferir sua matricula para o tão sonhado curso de direito.

            Todo esforço e dedicação foram oferecidos para a mãe, que sempre apoiou o estudo dos filhos mesmo não tendo condições de ajudá-los. Aldeniza diz que sua mãe tem orgulho ao apresentar sua filha como advogada, e lembra com emoção a ligação que fez para sua mãe para informar que havia passado na prova da OAB, todos seus familiares apóiam os estudos e a profissão.

            Hoje, após sua formação e atuando como advogada as dificuldades e aprendizados não cessaram, Aldeniza diz que aprendeu muito e continua a aprender e cita um ditado: “o que não nos desafia não nos faz crescer”.

 Sua cor ou religião e até mesmo sua regionalização não foram motivos de preconceito por parte da comunidade, porém, algo que deixou Aldeniza muito chateada e decepcionada foi o fato de um professor de seu curso dizer em sala de aula que um maranhense não teria capacidade de escrever um livro, algo pelo qual nunca ouviu desculpas.

             Agora

            Aldeniza está exercendo a profissão há três anos e se identifica com a área criminal, mas é atuante também no previdenciário, cível e trabalhista. Porém, ainda há outros sonhos e ela está para fazer um curso preparatório e atingir o cargo de Juíza de Direito. A ideia de um livro também é permanente, principalmente por conta do professor que a tinha desanimado. “Vou escrever um livro e mostrar para ele que tanto eu como tantos maranhenses temos a capacidade de escrever livros”.

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