Nova proposta para a Educação Nacional visa determinar os conteúdos essências para as etapas escolares em todo o Brasil
O MEC vem promovendo uma discussão sobre a proposta de implantar uma Base Nacional Comum Curricular, um assunto que divide opiniões entre os professores. A ideia seria padronizar os conhecimentos e habilidades ensinados nas escolas de todo o Brasil. As discussões foram iniciadas em junho do ano passado, quando um primeiro texto foi redigido. Depois disso uma plataforma foi criada para coleta de informações e participação geral de educadores e população. Nela são coletadas sugestões e críticas de todos para serem avaliadas e para que posteriormente se façam alterações e inclusões no texto final.
Segundo o site do MEC, atualmente o que define que será estudado e ensinado nas escolas são os manuais didáticos escolhidos, que por sua vez são elaborados com os conteúdos a serem cobrados nas provas de acompanhamento nacionais como a Prova Brasil e ENEM. A BNCC sugere que com uma base comum as desigualdades educacionais poderiam se extinguir, seria possível também ter materiais didáticos elaborados em um modelo equilibrado e adquiridos em grande escala.
Para o MEC tendo as expectativas de aprendizado e critérios de qualidade definidos seria possível estabelecer uma relação de transparência no processo educacional como um todo, identificando falhas e propondo soluções com mais agilidade.
Embora a ideia seja de padronizar, o texto garante que os métodos e formas de ensinar ficam sob responsabilidade de professores e gestores, ou seja, não será necessário tirar a autonomia no trabalho dos educadores, a ideia é definir o que será ensinado, o que o aluno deverá dominar em cada etapa da vida escolar. Desta forma o currículo ainda pode ser preenchido com assuntos locais, respeitando os costumes e práticas da cultura de cada região do país.
Outro dado importante, é que o conteúdo do texto da base deve valer para as escolas públicas e particulares. Esta seria uma estratégia para tentar igualar a qualidade de ensino.
O primeiro documento, redigido em junho de 2015, foi elaborado com a ajuda de membro das secretarias municipais e estaduais da educação, acadêmicos especialistas nas disciplinas e educadores da educação básica.
Entre os professores as opiniões divergem, para alguns as limitações e peculiaridades de cada escola ou região serão perdidas ao ter que seguir o roteiro do plano federal, outros ainda apontam que os conteúdos da base são amplos e pouco definidos, dando muita margem para interpretações aleatórias.
A professora e pedagoga Juliana Sauerbier, explicou alguns pontos a respeito do assunto.
Como surgiu a ideia de fazer a BNCC?
JULIANA: A Base Nacional Comum Curricular está prevista na LDB 9394/96 e da necessidade de uma única matriz curricular para toda a nação, onde todos os estados e municípios precisam de um documento que norteie o trabalho das Instituições.
Como são definidos os conhecimentos a serem abordados nas salas de aula hoje?
JULIANA: Eles são definidos com base nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica
Segundo a proposta da BNCC, como ela prevê que seja feita esta escolha?
JULIANA: A Base já traz uma proposta de conhecimentos distribuídos ao longo da Educação Básica em todos os conhecimentos curriculares. Estamos no período de audiências públicas na qual toda a comunidade pode opinar no que diz respeito a clareza, relevância e pertinência.
Quais as vantagens na implantação dessa proposta?
JULIANA: Não é possível definir vantagens e desvantagens porque ainda não foi implantado, pois está em fase de discussões.
Existem exemplos de países que têm este sistema?
JULIANA: Sim. É comum vários países se reunirem para realizar discussões para se ter uma única Base Curricular, como por exemplo: Austrália, Finlândia, Canadá, entre outros.
Qual foi o aproveitamento deles?
JULIANA: A Finlândia possui um documento dessa natureza desde 1998, considerado o país mais avançado em relação a essas discussões. Portanto, o documento é sempre discutido, reavaliado, para a melhora constante da qualidade na educação.
Não haveriam prejuízos para aos alunos?
JULIANA: Pelas discussões já realizadas pela comunidade, vários profissionais da educação, o propósito é que a qualidade seja efetivada da melhor maneira.
A BNCC seria uma forma de tentar equilibrar a qualidade da educação com o ensino privado?
JULIANA: Não, na verdade todos os cidadãos têm direito ao ensino de qualidade, onde necessariamente nem sempre por uma escola ser privada que ela apresenta essa qualidade.
Como funcionava a consulta pública? Até que ponto as pessoas podem opinar e contribuir?
JULIANA: A construção de uma BNC só é possível com a participação de toda a sociedade brasileira. Múltiplos atores envolvidos nesta dinâmica têm que ter espaço e meios para fazer aportes, considerações e observações nesse processo de elaboração: pais, alunos, professores, sociedade em geral, onde são colocados em pauta várias questões pertinentes e todos aceitam ou não. Se as mudanças forem pertinentes o documento se adequa a partir dessas opiniões e contribuições.
Hoje, no último dia da consulta, é possível ter um balanço de como foi a participação da população?
JULIANA: Sim, a comunidade foi participativa, apresentando contribuições significativas para a melhoria da qualidade na educação brasileira.
O cronograma previsto pelo PNE (plano Nacional de Educação), encerra o prazo para apreciação pública em 15 de março. Muitos professores já estudaram a proposta e suas justificativas e muitos deles não enxergam nessa medida uma forma de solucionar problemas estruturais curriculares.
Indiamara Aparecida D. de Souza Holleben, mestre em história e professora da rede estadual de educação a 30 anos, relata que em toda sua carreira já viu muitas medidas serem tomadas para tentar melhorar a educação no país. Ela aponta que um documento não seria capaz de garantir a tão sonhada equidade na educação brasileira. Para ela o Brasil traz muitas diversidades em sua cultura que devem ser respeitadas. A própria educação atual no país não é nivelada e isso prejudicaria o processo de aprendizagem de escolas que não tem as mesmas condições de alcançar a competência designada para a fase escolar.
“As peculiaridades de cada região, de cada unidade escolar, elas têm que ser preservadas. É obvio que seria um jeito de unificar, por exemplo, no sentido de que o aluno quando saísse daqui de Ponta Grossa e fosse lá pro Pará pudesse ter aquela continuidade no estudo dos conteúdos, mas isto é impossível de organizar. Outra coisa, depende também da condição física e estrutural de uma escola e da formação dos seus professores, porque sem a formação inicial para o professor entender tudo isso, este processo o currículo vivo na sala de aula não vai acontecer. ”
Ela relaciona a decisão de unificar os conteúdos com as provas que avaliam o desemprenho e desenvolvimento escolar no Brasil. Argumento usado por alguns críticos que seria a real intenção desta nova modalidade de currículo. Este ponto de vista leva em consideração o interesse do governo em elevar os níveis de desempenho das escolas nessas provas.
A professora Joice Stacheski, doutoranda em Educação pela Unvirsidade de São Carlos, diz que a Base Nacional apresenta um descomprometimento do MEC com os conteúdos clássicos. São conteúdos que, segundo a professora, devem ser apropriados pelos alunos por meio do processo de inserção escolar.
A falta de clareza e definição dos conteúdos a serem ensinados pelos professores deixa subentendido que qualquer conteúdo pode ser selecionado.
“É o empobrecimento do conhecimento até então já desenvolvido pelo coletivo da humanidade. É função da escola promover a socialização dos conhecimentos mais elaborados até então, e a Base Nacional vai na contramão desta proposta.”
Espera-se que até junho o documento final seja entregue e apresentado ao Conselho Nacional de Educação. Ainda não há estimativa de quando a Base Nacional Comum Curricular será adotada no Brasil.
Érica Tatiane Gonçalves
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